Direito da Moda do Estado de São Paulo

O Direito da Moda e os Desafios Sistêmicos da Indústria no Brasil.

Um olhar técnico sobre os limites éticos, estruturais e jurídicos do setor sob a ótica de gênero, consumo e autoridade institucional.

O universo da moda, frequentemente associado à estética, à inovação e ao dinamismo cultural, carrega em sua estrutura interna uma série de contradições pouco visibilizadas. Por trás das passarelas, campanhas publicitárias e semanas de moda, há um campo marcado por desigualdades, práticas laborais questionáveis, elitismo estrutural e um vácuo regulatório que compromete tanto os direitos autorais quanto os direitos humanos.

Essa análise, à luz do Direito da Moda, propõe refletir sobre os entraves enfrentados por profissionais do setor, especialmente mulheres,  e sobre a urgência de reposicionar o debate sobre ética, legalidade e sustentabilidade dentro da cadeia produtiva e simbólica da moda no Brasil.

Nos últimos meses, ao buscar colaborar com um hubs de moda, vivenciei um processo não formalizado de avaliação profissional marcado por condutas que contrariavam princípios básicos de respeito e reconhecimento técnico ao meu intelecto. A prevalência de comportamentos elitistas e prepotentes reflete uma estrutura que privilegia o status e a imagem em detrimento do mérito, da trajetória e do conhecimento.

Mesmo após décadas de atuação e pesquisa, vi-me diante da necessidade de “provar” meu valor em um ambiente pautado por dinâmicas excludentes, resultando no esgotamento da minha saúde mental — um tema sensível, mas ainda negligenciado nas pressões por performance em um sistema que desumaniza o trabalho intelectual e criativo.

O sistema de curadoria e promoção de marcas nas semanas de moda brasileiras ainda se ancora no chamado “QI” (quem indica), dificultando o acesso de marcas autorais e projetos sustentáveis sem respaldo de figuras públicas ou conexões estratégicas. Em contrapartida, projetos com pouco lastro técnico ganham espaço e legitimidade apenas pelo peso de nomes conhecidos, revelando como vaidades e marketing superficial ainda se sobrepõem à construção de um mercado sólido.

Neste cenário, é simbólico lembrar que, em 2025, a Lei nº 11.340/2006 — Lei Maria da Penha,  completa 19 anos como instrumento jurídico de proteção e garantia de direitos, lembrando a importância de ambientes seguros e equitativos. Na moda, cuja base criativa e operacional é majoritariamente feminina, as disparidades ainda persistem, especialmente em cargos de liderança.

A ascensão de plataformas como Shein e seus modelos de negócio baseados em alta rotatividade, preços baixos e falta de transparência ameaça marcas autorais e compromete anos de construção em prol de uma moda ética. Ao mesmo tempo, projetos comprometidos com o design local e o trabalho justo seguem invisibilizados.

O Direito da Moda, como disciplina emergente e interdisciplinar, tem o papel de iluminar essas contradições e buscar caminhos legais para proteger criadores, consumidores e profissionais alinhados a princípios éticos.

Que esta reflexão sirva como provocação sobre os limites éticos de um sistema que ainda privilegia o capital sobre o conhecimento, a aparência sobre o conteúdo e o poder sobre a equidade.

Texto de autoria - Vanessa Mayara Pestili 



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