Jung e Religião
Trago Jung para perto não como um autor confortável à academia, mas como uma inquietação viva. Sempre me chamou atenção o fato de ele ser constantemente mal compreendido: cientista e anticientista, místico e herege, filósofo e charlatão. Talvez porque Jung nunca aceitou reduzir a religião à razão fria, nem a psique a compartimentos estéreis. O que o movia, e o que também me move, era o mistério.
Desde jovem, Jung já perguntava aquilo que atravessa toda a filosofia da religião: qual é o sentido da vida, do sofrimento, do mal? Onde habita a alma? O que nos liga ao numinoso? Sua crítica ao materialismo não era ingênua, mas profunda: negar a realidade do invisível é empobrecer o humano. Para ele, a ciência que ignora a alma e a religião que esvazia o mistério produzem o mesmo efeito, um homem fragmentado, vazio, adoecido de sentido.
Ao longo de sua obra, Jung insiste que a neurose moderna não é apenas clínica, mas espiritual. Sofremos porque nos afastamos do que dá significado à existência. A verdade religiosa, para ele, não é dogma, é experiência viva na psique. Não se trata de acreditar cegamente, mas de reconhecer que há algo em nós que ultrapassa os sentidos e exige escuta, ética e coragem interior.
A psicologia junguiana nasce exatamente nesse lugar liminar: entre ciência e filosofia, entre razão e símbolo, entre o visível e o invisível. Não promete eliminar o sofrimento, mas ajudar a suportá-lo com consciência. Jung nos lembra que conhecer a alma não acontece nos livros ou nos laboratórios, mas na vida, nas paixões, nas quedas, nos conflitos, nas perguntas que não se calam.
No fundo, sua obra é um convite radical: religar-se ao mistério, sustentar a tensão entre luz e sombra, e assumir a responsabilidade ética por aquilo que somos. Porque talvez só assim seja possível atravessar as ruínas do nosso tempo sem perder a alma.








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